“ – Que gigantes? – interrogou Sancho.
– Atente bem, Vossa Mercê. O que se descortina além fora não são gigantes, mas moinhos de vento.”
Já parou pra pensar o quanto a gente acaba modificando os fatos com nossas percepções? Eu já escrevi sobre isso, no post sobre a parábola do elefante. Mas novamente volto no tema.
Ontem criei um post saudando o fato que os BDRs foram liberados pela CVM para negociação por parte dos investidores pessoas físicas. Algo que considero ótimo, porque entre outras coisas desburocratiza o investimento no exterior.
Porém um fato que me chamou a atenção foram: a crítica embasada por um viés de confirmação.
BDR e “olha a Argentina”
Um dos argumentos contra os BDRs são que os investimentos não estarão no exterior de fato, visto que o BDR é um certificado que possui um lastro com um outro ativo no exterior. A garantia existe, mas o BDR em si fica aqui, no Brasil, havendo um terceiro agente envolvido no ativo. Mas pra mim esse não é um verdadeiro lado ruim da BDR.
Porém muitos olham com maus olhos para o fato dele estar no brasil, usando o argumento “olha o que acontece com os argentinos” para pautar a opinião. Claro que existem riscos nesse veículo de investimento, porém, na minha opinião, o argumento “Argentina” é uma evidência anedótica, mostrando um forte viés de confirmação.
Evidência anedótica
Se você não souber, uma evidência anedótica é uma informação que não é baseada em fatos ou estudo. De modo geral são casos pontuais, que não são regra – e até costumam ser exceção. Já o viés de confirmação se dá quando você busca apenas as informações que confirmem suas crenças ou hipóteses. Percebeu a relação intima entre o viés e a evidência anedótica, né?
O buraco é mais embaixo pro argumento “Argentina”
Muita gente sai usando o argumento “Argentina” – que de certa forma pode ser uma possibilidade a ser considerada – mas sequer pensa numa situação hipotética ela ocorra de fato. Já imaginou que a explosão do caso como a Argentina pode trazer outros problemas que não serão resolvido apenas com dinheiro em corretora no exterior?
Repara outras questões levantadas quando você pensa sobre isso ocorrer:
- Será possível você ir até o exterior e se manter lá enquanto as coisas estiverem do avesso aqui?
- Será permitido você ficar no exterior por quanto tempo? Você possui outra nacionalidade para isso ou só visto de turista?
- A porcentagem de patrimônio no exterior será realmente suficiente para caso uma situação como essa ocorra?
O verdadeiro lado ruim da BDR
BDR pode sim ser um bom veículo de investimentos, mas você precisa entender qual a sua necessidade e objetivos para concluir se deve ou não usar. Para argumentar melhor, que tal trabalhar com fatos? Existem algum fato que torna BDR um investimento ruim? Claro, alguns por sinal!
1) BDR pagam dividendos em Reais. Eu particularmente prefiro manter dividendos e afins na moeda que estou investindo. Eu não quero correr o risco de perder uma alta da moeda ou ainda sofrer com algum spread na conversão da moeda. Repara que são alguns dias até o pagamento dos dividendos dos BDRs e ficar fora do mercado com essa grana pode custar caro.
Esse é o MEU ponto de vista, de alguém que vai receber os dividendos e reinvestir, talvez não seja válido para quem vai usar o dividendo aqui no Brasil ou não reinvista.
2) BDR tem acréscimo de taxas (uma das piores inimigas do investidor – mais do que a Argentina)
Deixo o Itaú falar por mim, abaixo. Além da taxa de impostos americanos – que não tem escapatória – existem as taxas de IOF (0,38%) e taxa do custodiante de (5%).Taxas são terríveis e podem comer seu investimento.
Esse é um argumento válido para MIM, que vou manter meus investimentos no exterior por pelo menos uns 20 anos. Assim, quanto menos frictional costs, melhor. Mais uma vez, isso talvez não seja válido para quem quer ter o dinheiro na mão ou ter maior flexibilidade para direcionar o fluxo de renda.
Conclusão
“O lado negro é mais forte?” Luke pergunta.
“Não, não, não..” Yoda o assegura. “Mais rápido, fácil, mais sedutor.”
Novamente, como falei nesse post sobre a fábula do elefante, procure por fatos e entenda a realidade através deles, para não ter uma percepção errada ou enviesada. Eu sei que é um exercício mais trabalhoso e longo, mas é esse o mesmo motivo pelo qual o viés vai fazer você estar errado ou se enganar. O viés de confirmação e a evidência anedótica são o caminho mais curto, mais fácil – e mais sedutor, como diria o Yoda – mas te levarão a um caminho cego.
BDRs tem suas vantagens e desvantagens, eu apresentei só alguns e ainda com o viés do meu ponto de vista. Você precisa lidar com os fatos e identificar o porquê ele não seria adequado para você – independente da Argentina.
Parabéns pelo texto , sensato sem ser discursivo ou tentar provar o lado bom ou ruim do BDR usando seus investimentos diretos como viéis sensacionalista, acredito que aos poucos trazendo fatos reais as cartas serão mais claras , ex vem aí o split de Tesla e Apple , 5 e 4 por 1 respectivamente o acréscimo de R$ 0,10 por cada evento Cobrado por cada BDR pode levar a outros caminhos . Já tive desdobramentos e agrupamento nos USA assim como incorporações por outras empresas onde parte veio em ações e parte em dinheiro , uma tremenda confusão para eu declarar a nova empresas ( explicar os fatos e valores ) parte da sobra de desdobramentos podem vir em dinheiro . Tudo isso em uma BDR significa custos .
Obrigado pelo seu comentário e relato Maurício, são várias situações pra se levar em conta mesmo.
BDR e ETFs são escapes para investidores! Mestre Yoda tem razão! Mas sempre é bom observar como a manada vai se comportar! Será uma boa análise!
Boa! Obrigado pelo comentário!
Excelente texto! Obrigado por compartilhar sua visão com a gente e sempre incentivar a reflexão do que é melhor para o indivíduo. Coisa rara hoje em dia!
Obrigado João!
Excelente reflexão! Obrigada!
Eu que agradeço pelo comentário Glenda!